domingo, 20 de maio de 2012

MUDANÇAS DOS PARADIGMAS DE SALVAÇÃO





No decorrer de quase 20 séculos de história da igreja cristã, ocorreram várias mudanças de paradigma tanto em termos de pensamento teológico como na prática efetivamente.
Uma delas, na qual desejo concentrar-me neste artigo, são as significativas mudanças da compreensão soteriológica que a igreja apresentou ao longo de sua história.

Antes, porém, é importante salientar que, em alguns casos as diferenças e transformações foram tão profundas e de tal alcance que os historiadores têm dificuldade de reconhecer quaisquer semelhança entre os modelos teológicos e eclesiológicos que operaram por determinado tempo. Isto, em se tratando de uma única igreja, torna-se um ponto relevante em qualquer pesquisa. Como se não bastasse, existe ainda, a realidade de cosmovisões divergentes entre as igrejas Oriental e Ocidental, que traçaram uma linha divisória entre si com tal radicalidade, que é necessário algum esforço para encontrar alguma compatibilidade entre elas. E ainda hoje se acusam mutuamente de anti-ortodoxia. Pois nunca chegaram a uma posição consensual nem da forma nem da prática existentes nos seus paradigmas.

A salvação é efetivamente, um assunto fundamental para qualquer religião. Para os cristãos, a convicção de que Deus operou, de forma decisiva, a salvação para todas as pessoas em e através de Jesus Cristo constitui o âmago de suas vidas. Afinal, o próprio nome Jesus significa “Salvador”.

Com base nesta premissa que a igreja desde seu início, assumiu a prerrogativa de mediar ou servir-se de portadora da salvação a toda humanidade. Mas a conclusão que chegamos é que o conceito de salvação vigente não foi dominante ao longo dos séculos. Logo, surge então alguns impasses de ordem epistemológica. 

Para termos uma ideia, durante quase toda a idade média, os cristãos concebiam a salvação em termos de coletividade. Ou seja, o indivíduo era salvo quando inserido no contexto da comunidade cristã, a chamada eclesiasticização da salvação. Idéia que teve origem em Agostinho na sua obra “A Cidade de Deus”. A salvação que ocorre, em termos de individualidade, é uma concepção relativamente nova, que teve sua gênese na reforma.

Mas para melhor compreendermos esta questão, se faz necessário retrocedermos pelo menos até o período neo-testamentário, onde percebe-se, que, salvação naquele contexto, foi interpretada em termos mais abrangentes. Isto é, não se restringia ao um livramento de juízo e de perdição no além. Na perspectiva de Lucas, por exemplo, como se vê por inferência em seu evangelho, salvação é, antes de tudo, algo que se realiza nesta vida, hoje. Para Lucas, a salvação é salvação no presente.

Enquanto que em Paulo, sua ênfase parece distinta. A salvação era vista como um processo que, tem apenas seu início nesta vida, que acontece com o encontro da pessoa com o Cristo vivo, mas a salvação completa está ainda pendente. Será concluída somente “com” e “na” glorificação completa do crente. Neste aspecto, a salvação se enquadra em categorias apocalípticas e de juízos.

Já no período da patrística grega a salvação deixou de ter essa conotação, para assumir a forma de Paidéia, de uma gradual elevação dos crentes a um status divino (a theosis). Neste caso, entendia-se a salvação como uma progressão pedagógica. Nesta teoria especificamente, enfatiza-se a origem de Cristo. E a encarnação encontrava-se no centro, como instrumento da Paidéia divina.

Entretanto, com o advento do iluminismo, toda essa interpretação de salvação passou a ser pressionada intensamente, resultando numa crescente contestação da soteriologia tradicional. Basicamente tudo teve que ser revisto. A idéia de uma salvação vinda de fora, de Deus, totalmente inacessível ao poder e à capacidade humanas, tornou-se muito problemática.

O que conhecemos hoje como crítica moderna da religião teve aqui, no iluminismo, seu ponto de partida. A religião como expressão da completa dependência e como salvação eterna no além constituía um anacronismo e um remanescente do estágio infantil da humanidade. A salvação agora foi resignificada como libertação da superstição religiosa, preocupação com o bem estar do ser humano e o melhoramento da humanidade.

Note que não houve uma ruptura radical com o pensamento iluminista. Temos seus batedores operando ativamente ainda hoje.

Outro ponto digno de nossa atenção, já que tocamos no assunto, são as diferentes ênfase daquilo que é chamado de “evento salvífico”. Por exemplo:

Enquanto que o Oriente concebia a salvação como uma progressão pedagógica, o Ocidente (católico e protestante) destacava o efeito devastador do pecado, assim como a restauração do indivíduo caído através de uma experiência de crise mediada pela igreja. Neste aspecto, nem a preexistência de Cristo nem sua encarnação, mas sua morte vicária na cruz, (doutrina aprimorada pela teoria de Anselmo sobre a satisfação vicária), encontrava-se agora no centro. A salvação representava a redenção de almas individuais no além, o que aconteceria por ocasião do apocalipse ou da morte individual do crente.

Note que o paradigma da salvação na perspectiva da patrística grega, estava voltado para a origem e o início da vida de Jesus. Para sua preexistência e encarnação. Enquanto o modelo ocidental orientava-se para o fim da vida de Jesus – sua morte na cruz. (expiação)

A igreja ocidental, tanto católica como protestante, preocupa-se com a paixão e a crucificação de Jesus. Em nossa compreensão soteriológica, a essência do evangelho é que Cristo morreu por meus pecados. A base da salvação está nesse ato. Cristo é o novo lugar de expiação, em substituição do templo. A cruz é o cerne da mensagem salvífica.

O problema decorrente deste paradigma é que a morte de Jesus é sutilmente isolada de sua vida.

Nós ocidentais, ou as igrejas protestantes, em geral, temos uma teologia subdesenvolvida da encarnação. Entretanto, foi exatamente em nosso ambiente que surgiu a teologia da libertação, que bem mais explicitamente do que foi feito até agora, entendeu a missão cristã em termos do Cristo encarnado, do Jesus de Nazaré humano que, exausto, trilhou os caminhos poeirentos da Palestina, onde se compadeceu das pessoas que estavam marginalizadas. Do mesmo modo ele se encontra do lado dos que sofrem nas favelas do Brasil, dos marginalizados e oprimidos pelo sistema vigente.

Nesse paradigma, a salvação é holística. Nele, o interesse não está em um Cristo que oferece apenas a salvação eterna, mas em um Cristo que sofre e sua e sangra junto com as vítimas da opressão.

Para finalizar, quero destacar que este texto apresenta apenas uma sinopse acerca do desenvolvimento e das modificações dos paradigmas teológicos, com enfoque, é claro, para as mudanças no tocante a doutrina da salvação.

E a tese que alguns defendem é que estas transformações não chegaram ao fim. E que talvez jamais chegará! Sobretudo quando constatamos uma atualidade repleta de modelos trabalhando concomitantemente, rivalizando entre si com temas aparentemente irrelevantes, mas que demonstra sutis ou totais incompatibilidades entre os mesmos.

Por Donizete.

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quarta-feira, 16 de maio de 2012

AMOR E SEXO



Amor é cristão, Sexo é pagão
Amor é latifúndio, Sexo é invasão
Amor é divino, Sexo é animal
Amor é bossa nova, sexo é carnaval (Rita Lee)

Em nossa cultura, o sexo é colocado num lugar de obscuridade. É visto como algo mundano, sujo e profano, e jamais como algo bonito, divino e nobre.
O grande responsável por este conceito errôneo foi Platão, quando ele, em sua filosofia gerou uma dicotomia na mente humana, acerca do que é espiritual e do que é material. Do que é corpo e do que é alma.
Platão defendia que, as coisas boas e perfeitas pertencem ao mundo das idéias. Mundo metafísico, mundo ideal a ser conquistado. Enquanto que as coisas do mundo físico, material, o mundo dos sentidos e das sensações, é o que se opõe a este mundo ideal.
Platão entendia que estes dois mundos estão em antagonismos, em guerras constantes, para se alcançar este mundo noumenal, o homem teria que travar uma guerra contra o outro mundo, o mundo fenomenal, que era o ilusório, enganoso e mal.
Não nos causa nenhuma surpresa constatarmos Paulo dialogando com a filosofia platônica em seus escritos, quando por exemplo, ele explica os constantes embates entre a carne e o espírito, um se opondo ao outro.
Mas foi durante a idade média que a igreja adotou de vez o paradigma da filosofia de platão, e começou a conceber a vida dessa forma. A idéia de que Deus não tem interesse nenhum no corpo, e erroneamente é visto como a prisão da alma, das coisas boas, gerou algumas doutrinas que levaram as pessoas ao auto flagelo e as penitencias.
Outra coisa derivada dessa idéia, é de que aqueles que queriam se dedicar a Deus tinham que reduzir ao máximo os prazeres do corpo. Logo, a pessoa que tivesse vida sexual ativa não podia desfrutar da intimidade com Deus. Esta tensão entre a sexualidade e o sagrado sempre esteve presente na igreja cristã.
Entretanto, esta dicotomia não é exclusividade da cultura cristã, mas até mesmo na cultura secular contemporânea.
Um dos sucessos da Rita Lee faz uma comparação entre o amor e o sexo. Ela enfatiza esta dicotomia atribuindo a sexualidade algo perverso, maléfico e obscuro. Segundo a música, o amor é cristão, já o sexo é pagão. Muito embora expresse o senso comum, trata-se de um equívoco; sexo é cristão tanto quanto é o amor.
Deus é muito mais a favor do sexo do que podemos imaginar. Desde é lógico, que o sexo não seja apenas mais uma opção de entretenimento para consumo individual ou usado de forma ilegítima.
Por Donizete