Por J. Lima.
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante
Eu prefiro ser
Essa metamorfose ambulante
Do que ter aquela velha opinião formada sobre tudo. Raul Seixas
Houve um tempo em que eu era critico feroz das músicas do Raul Seixas, e ainda continuo, mas agora vejo no conteúdo revelações sobre uma “antropologia existencial”. Acho que no processo de viver, também me reconheço como uma “metamorfose ambulante”, visto que a vida do ser humano consiste em constantes “mortes de formas” no caminhar da existência.
Se não fosse esse dinamismo de “morrer as formas”, extinguiria a raça, a beleza da humanidade está em que na “morte das formas”, preserva-se a vida. È nisso que persiste a existência humana, uma verdadeira “meta-morfose”, uma forma que está para além dele mesmo, está sempre em construção o que contraria praticamente o pensamento ocidental que tem sua gênese na filosofia “socrático-platonica-Aristotélica”.
O conteúdo da letra dessa música mostra que a cristalização do pensamento da chamada “verdade meta-física”, o “ideal” platônico, é arqui-“inimiga” da vida, pois essa, é uma “construção em movimento”, é a partir do trágico, que a vida ganha impulso, o desamparo do homem diante a imensidão do universo, empurra-o na busca de uma “segurança”.
Da insignificância nasce o desejo de “Transcendência” que imerge como uma necessidade de continuidade da existência! Esse desejo anseia por uma verdade “formada”, mas essa nas contingências da vida precisa perder a “forma”, é preciso então ter coragem para re-ver as opiniões que se tinha ontem, aceitar a contra-“adição”, o paradoxo da vida, afinal a lógica não vem da vida, mas da imposição da razão sobre o livre curso da natureza.
A razão não é natural, é uma imposição, uma forma de manter a existência dentro de limites, pois esses impedem do homem se diluir, mas essa razão que impões limites para preservação da vida, deve perceber que há tempo de “perder a razão”, a cristalização da razão congelada, elimina a riqueza do devir [1].
Dai Heráclito dizer:
“O mesmo homem não pode atravessar o mesmo rio, porque o homem de ontem não é o mesmo homem, nem o rio de ontem é o mesmo do hoje".
Acho que Nietsche tinha razão: “Toda vida se alimenta de outra vida”. Para se manter viva, a vida alimenta-se de outra vida, e dela própria, pois viver implica em constantemente morrer, a morte é o alimento da vida. Interessante...
“A ceia do cristão é alimentar-se do corpo de quem morreu”, pela morte do corpo, a vida torna-se alimento para os que vivem...
[1] Devir é um conceito filosófico que qualifica a mudança constante, a perenidade de algo ou alguém.
Quantas vezes acontecem à morte das formas em nossa existência?
ResponderExcluirAinda no ventre materno, acontece a morte da forma do espermatozóide para dar lugar a do bebê.
Mais tarde, a do bebê para a criança. Da criança para a adolescência. Da adolescência para a jovem. Da jovem para a adulta. E dessa para melhor idade.
E dependendo da quantidade de anos que vivemos, corremos o risco de ganharmos novamente as formas semelhante às da infância. Só muda-se a especialidade médica, para onde geralmente somos levados.
Sem falar da morte das formas dos saberes. Das constantes desconstruções de conceitos e nascimentos de novas idéias.
Da morte das formas dos paradigmas, que à medida que vão se tornando obsoletos, dão lugar a um mais moderno.
Entretanto, acredito que, antes de ser assustadora, é fascinante a idéia de que a nossa existência é uma constante desconstruções daquilo que foi a bem “pouco tempo” construído.
Por isso, faço minhas as palavras de Horácio: Carpe diem!
doni,
ResponderExcluirjá tinha lido e gostado(evidente)desse texto do jl. um outro filósofo da mpb também cantou:
a vida vem em ondas como o mar
num indo e vindo infinito...
não sei como alguém pode dizer coisas como "eu aprendi assim e vou morrer crendo assim".
isso solidifica a vida; o movimento e a transformação que alentam o pensamento acaba ficando como água parada propícia a ser criadoro de mosquitos.
por isso gosto da ideia hindu do deus dançarino. nietzsche escreveu que só poderia crer num deus que soubesse dançar.
O problema do devir é um dos principais da especulação filosófica. Antes de Hegel e Nietzsche desenvolverem suas teorias sobre ele, Aristóteles já tinha ficado maravilhado ao descobrir que o devir é necessariamente causado.
ResponderExcluirAs vezes ficamos impacientes e preocupados com o devir. Conforme o JL colocou no texto, a máxima de Heráclito era de que todas as coisas fluem continuamente. Se você coloca um pé no rio, na hora que você colocar o outro pé, o rio já terá fluído adiante. Ele já terá mudado. e você também já terá mudado. Pelo menos no fato de ter ficado pelo menos alguns segundos mais velhos. (sproul).
Será que a teoria de Parmênides (contemporâneo de Heráclito) “ tudo o que é, é”, não seria mais interessante? Porque aí o conceito do devir seria apenas uma ilusão. Porque nunca deixaremos de ser o que somos. Ou seja: não há espaço para surpresas.
O conceito de Parmênides é de que tudo que existe de modo absoluto, não pode mudar. Porém se tivermos esta concordância não corremos o risco de entramos nesse estado de inércia e talvez venhamos a sofrer com a síndrome da Gabriela que você colocou usando a imagem da água parada?
Uma coisa é certa Edu,
Hoje somos o resultado daquilo que construímos durante o tempo que chamamos de passado. O nosso futuro está ainda em construção. Suas formas, de certa maneira, transcende nossa capacidade de previsão.
Como disse Tiago:
"Ouçam agora, vocês que dizem: "Hoje ou amanhã iremos para esta ou aquela cidade, passaremos um ano ali, faremos negócios e ganharemos dinheiro".
Vocês nem sabem o que lhes acontecerá amanhã! Que é a sua vida? Vocês são como a neblina que aparece por um pouco de tempo e depois se dissipa.
Ao invés disso, deveriam dizer: "Se o Senhor quiser, viveremos e faremos isto ou aquilo".
Tiago 4:13-15
Outra coisa Edu,
ResponderExcluir"Nietzsche disse que só creria num Deus que soubesse dançar".
Alguém disse que por insensibilidade ou por distração o pensador não percebeu que em Jesus Deus estava dançando e, por isso, perdeu o show e não pode apreciar a dança.
Sim, em Jesus Deus dançou e dança de forma graciosa conosco. Ninguém que com alguma percepção e sensibilidade leia o Evangelho deixará de ver Jesus em constante dança.
Boa colocação!
Gostei dessa definição "Toda vida se alimenta de outra vida”. Para se manter viva, a vida alimenta-se de outra vida, e dela própria, pois viver implica em constantemente morrer, a morte é o alimento da vida. Interessante... " Nunca tinha ouvido a esse respeito. Se vivemos é porque alguém morreu, e se morrermos hoje deixaremos uma nova vida, com experiencias, e idéias para outras futuras vidas. Bom devo me alimetar hoje para que possa servir de alimento amanhã!
ResponderExcluirGosto de citar: "O grão de trigo caindo na terra tem que morrer ou fica só..."
ResponderExcluirOuvi muitos anos atras uma mensagem de um jovem Jocumeiro, falando como Deus dançava após cada criação Sua. A mensagem foi tão real e tão lógica, que tínhamos vontade de dançar com toda alma e corpo.
Parabéns Donizete por sua mente brilhante.
Obrigado Guiomar.
ResponderExcluirSempre leio seus textos e comentários nos blogs dos colegas. Admiro demais a firmeza com que defende suas convicções.
Com certeza esse é motivo do respeito que tens até mesmo daqueles que não compartilham da mesma fé.
Abraços!
Cara, o Raul com algumas de suas composições foi e continua sendo simplesmente voz que clama em meio aos "de sempre...".
ResponderExcluirOs de sempre precisam perceber o hoje e ter a coragem de se reciclar para o amanhã.
Os absolutos constantemente se tornam obsoletos, as mais severas certezas transforman-se em frágeis impressões.
Valeu Doni!
O texto é interessante, porém você deve estar lembrado Donizete que certa vez eu conversei com você a respeito disso, e a questão da metamorfose ambulante pode valer para nosso corpo fisico, pois como alguém já disse certa vez que nós começamos a morrer logo que nascemos.
ResponderExcluirPorém não acho que uma "metamorfose ambulante" deve fazer parte do nossos pontos de vista e opiniões a respeito de vários assuntos. Cetamente,por vezes, temos que rever nossos conceitos e se "metamorfosear", mas ser uma metamorfose ambulante que a toda hora muda de opinião para mim parece mais uma falta de caráter, uma pessoa incapaz de se decidir sobre algo, afinal fica mudando a toda hora. Reciclagem faz bem a todos, mas acho que não precisa se uma metamorfose constante e sem critérios, pois quem muda a toda hora geralmente são pessoas que fazem suas escolhas sem seguir nenhum critério.