Há poucos dias me falaram de uma moça
que foi curada de terríveis dores no corpo em uma igreja pentecostal. Sua
família está em festa. Ao mesmo tempo fiquei sabendo de uma senhora desesperada
que pedia oração pela vida da sua filha que estava internada já em estado
terminal, acometida por um câncer raro. Detalhe, as duas famílias faz parte da
mesma comunidade. Naquele instante imaginei o turbilhão de angústias e dúvidas
que devem ter invadido a alma daquela mãe que ouve uma pessoa dizer que foi
receptora de um milagre, que Deus foi presente agindo em seu favor, enquanto
que na sua própria vida, a espera e o silêncio tem sido a resposta. Afinal de
contas, é na espera de uma intervenção em momentos oportunos que o crente
organiza sua vida.
Na minha ótica particular, não posso crer que Deus atua para os que menos
necessitam como fazem os políticos insensíveis e inescrupulosos. Contudo, a fé
evangélica invariavelmente é norteada pela lógica contabilista e mercantilista
da meritoriedade em detrimento da emergência. Fica pior ainda quando vemos que
o modelo adotado evidencia a causalidade como principal fator de punição e
recompensa, de modo que; quem recebeu, agradeça! Quem não recebeu, faça por
merecer. Evidentemente esse conceito não é admitido pelo religiosamente
correto. Porque a rigor, atribui-se a Deus, o livramento de um dentre muitos
que são vitimados, colocando-o no grupo de uns poucos privilegiados que de uma
maneira ou de outra fazem parte de algum plano secreto divino. Porém, essa
construção pode ser desfeita com a ótica de que este “Modus operandis” faz dele
um oportunista que usa a desgraça de muitos como trampolim para sua
popularidade via aquele que se salvou.
Mas a despeito de tudo isso, e apesar de ter frequentado uma igreja pentecostal
por vários anos, nunca me impressionei com os supostos casos de curas e
milagres que aconteciam naquele ambiente como respostas à fé, e também nunca me
revoltei no caso da ausência deles. Pois acredito que as curas classificadas como
miraculosas são na verdade fenômenos que ocorrem por sugestão e/ou são
provocados pela alteração do organismo, mas com uma coisa em comum em sua
ocorrência: elas sempre possuem como origem os estímulos externos. Milagre para
mim, seria o pseudônimo de um evento natural aleatório com probabilidade de
atingir um indivíduo também aleatoriamente ou contingentemente. Neste aspecto
tanto o evento como o receptor não são previamente selecionados por uma força
inteligente. Simplesmente ocorreram. Inclusive, uma coisa parece certa em
meios científicos; aquilo que hoje ganha contornos espetaculosos, no futuro
será algo comum, natural e até banal.
Andando nessa mesma via, mas lançando mão de pressupostos
científicos, certo teólogo afirmou que ele considerava a mecânica quântica a
maior ameaça contemporânea do cristianismo. Na verdade ele afirmou que, se
alguns resultados dessa teoria forem realmente verdadeiros sua fé pessoal em
Deus seria despedaçada. Se acaso eu tivesse a oportunidade de encontrá-lo, lhe
diria que não há necessidade de abrir mão por completo da sua convicção, mas
sim repensá-la! E a propósito lhe informaria também que a Unicamp, já aponta
para a possibilidade de num futuro bem próximo apresentar um aparelho, que é
capaz de detectar a presença de algum tipo de energia física no pensamento.
De maneira simplória, isso significa dizer que nosso pensamento se assemelha ao
vento. Não pode ser visto, entretanto é detectável empiricamente e tem força
mensurável matematicamente, capaz de realizar alguns fenômenos ditos
"paranormais". E fatalmente, se tudo aquilo que prevê esta teoria,
for confirmado, muitos aspectos da fé cristã e a reboque, de outras religiões,
terão que submeter vários de seus conceitos à uma profunda revisão. Sobretudo
no tocante a investigação que envolve as curas e os milagres. Pois esses
eventos, tido atualmente como fenômenos metafísicos, sobrenaturais, seriam
“rebaixados” à categoria de eventos empiricamente explicáveis, sem serem
necessariamente provocados por uma estância superior, o qual chamamos de Deus.
Fico na expectativa que um dia aconteça um estudo conclusivo
em relação à esse tema. Primeiramente, pela simples razão das pessoas não
precisarem mais sofrer duas vezes procurando motivos e nem o sentido que
envolve os fatos que os oprime. Mas sobretudo, pelo fato de quando
entendermos um pouco melhor essa questão, iremos excluir Deus dessa injustiça
ou fria que nós o metemos. Isto é, de estar na sua vontade à causa pelo sucesso
de uns e o fracasso de outros na busca por uma intervenção face às suas
demandas.
Donizete
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